terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Resíduos da agroindústria como fonte de fibras para elaboração de pães integrais


Pesquisa desenvolvida nos laboratórios da Universidade com resíduos da agroindústria foi aplicada em ambiente comercial


Pão feito com farinha da casca de cupuaçu
Crédito: Bruno Sanches Rodrigues


Casca de cupuaçu
Crédito: Bruno Sanches Rodrigues


Massa crua modelada
Crédito: Bruno Sanches Rodrigues 

da ESALQ
 A expectativa pelo desenvolvimento da agroindústria e a preocupação com o descarte dos resíduos são fatores que contribuíram para a conclusão de recente pesquisa realizada no Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição (LAN) da Escola Superior da Agricultura "Luiz de Queiroz" (USP/ESALQ) que, além de caracterizar o objeto de investigação, conquistou sua aplicabilidade.

O aumento da produção pela agroindústria ao mesmo tempo em que proporciona benefícios, gera uma grande quantidade de resíduos que, se não tratados de forma adequada, trazem malefícios à sociedade e ao ambiente. Preocupado com a questão, Bruno Sanches Rodrigues, formado em Ciências dos Alimentos pela ESALQ, apresentou a dissertação "Resíduos da agroindústria como fonte de fibras para elaboração de pães integrais", desenvolvida pelo programa em Ciência e Tecnologia de Alimentos, tendo como orientadora a professora Jocelem Mastrodi Salgado. Por se interessar pela área dos funcionais, durante a graduação, o aluno já era membro do Grupo de Estudos em Alimentos Funcionais (GEAF), grupo este coordenado pela sua orientadora.
Rodrigues revela que iniciou seu projeto com anti-oxidantes, compostos bioativos igualmente trabalhados na área de alimentos funcionais. Por meio da coordenação do GEAF, o aluno foi apresentado a uma empresa extratora de óleo de frutas que estava em busca de uma solução para os resíduos. Seu trabalho adquiriu um novo foco quando as amostras para análise começaram a chegar no laboratório. "A legislação brasileira pede que você dê um tratamento adequado aos resíduos transformando-os em algo útil na alimentação", comenta ele. 

Para o desenvolvimento do trabalho, o pesquisador trabalhou com três culturas diferentes: açaí, buriti e cupuaçu com o objetivo de caracterizar as polpas e as sobras do processamento. "Os resíduos são gerados pela casca, semente, endocarpo e polpa que após prensados surgem no formato de torta desengordurada. Após análise dessa torta, tivemos que definir um produto final porque encontramos um leque muito grande de resultados. Enfim, encontramos a melhor fonte de fibras para a elaboração de pães integrais de acordo com expectativas de se produzir um alimento seguro que também gerasse renda".

A pesquisa

Os resíduos foram separados em torta desengordurada de açaí, de buriti e cupuaçu; açaí integral; semente do açaí; endocarpo esclerificado do buriti; casca do buriti; buriti integral; semente do buriti; casca do cupuaçu; cupuaçu integral e semente do cupuaçu. Foram realizadas análises de composição centesimal e coloração nas polpas e resíduos. "A casca de cupuaçu apresentou melhores características para elaboração de uma farinha para desenvolvimento de pães", relata o pesquisador.

Os pães foram desenvolvidos substituindo parcialmente a farinha de trigo pela farinha da casca de cupuaçu (FCC) em 0%, 3%, 6% e 9% analisados quanto à composição centesimal, antinutricionais, propriedades físicas e aceitabilidade pelos consumidores. Como resultados, os pães integrais tiveram sua composição centesimal quase inalterada em função da substituição da farinha de trigo pela farinha de casca de cupuaçu, exceto pelo aumento gradativo no teor de fibras alimentares em detrimento do teor de carboidrato. Dessa forma, os pães com 6% de FCC, segundo a nossa legislação, podem ser considerados como "fonte de fibras" e os pães com 9% com "alto teor de fibras alimentares". 

"Tivemos que garantir aos provadores que mesmo não havendo na literatura um pão produzido com farinha de casca de cupuaçu, tratava-se de um alimento seguro e de acordo com as normas exigidas. A análise sensorial foi feita numa padaria. Busquei sair um pouco do laboratório para ter uma extensão do projeto na comunidade. Nós queríamos testar as fibras para ver se eram realmente viáveis".

Um dos pontos importantes do resultado da pesquisa indica que o aumento do teor de FCC proporcionou diminuição no valor calórico dos pães em relação ao padrão, assim como melhor digestabilidade protéica in vitro; aumento não significativo nos teores taninos; leve aumento no teor de fitatos e fenólicos totais, porém próximos aos encontrados em literatura.

O valor de pH pouco variou nos pães. A farinha de casca de cupuaçu contribuiu para aumentar a diferença de cor dos miolos dos pães do que da crosta dos mesmos, onde maiores quantidades de farinhas de casca adicionadas promovem colorações mais escuras. Por outro lado, o volume dos pães diminuiu proporcionalmente em relação ao aumento da substituição da farinha branca pela de casca, quando comparados ao pão padrão. 

O teste de aceitação constatou que 72,5% consumiam pães diariamente; 67,5% consideraram pães importantes na alimentação e 65,0% declararam importante o consumo de fibras para a saúde.

Quanto à avaliação da qualidade, os pães com 0%, 3% e 6% de farinha de casca de cupuaçu obtiveram ótima aceitação e seriam consumidos por 92,5% dos provadores.
"Sempre comentamos em laboratório entre professores e alunos que não temos que produzir pesquisa para ficar na gaveta dos pesquisadores. Temos que produzir pesquisas que gerem um retorno à sociedade, que é o intuito da universidade", conclui Rodrigues.

Texto: Alicia Nascimento Aguiar (14/12/10)