da UFMG
Sem desconhecer a importância das desigualdades econômicas e sociais, é fundamental incorporar às reflexões – e ao desenho de políticas públicas – a discussão sobre o papel que o espaço exerce nessas mesmas desigualdades. É o que defende o professor Ralfo Matos, do Departamento de Geografia do Instituto de Geociências (IGC) da UFMG, que coordenou a pesquisa Desigualdades socioespaciais e descentralização territorial no Brasil atual, desenvolvida com apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
"Não se deve pensar apenas nas relações econômicas e setoriais e ignorar o espaço, como se faz na maior parte das políticas públicas. O que propomos é juntar as duas coisas", defende o pesquisador. Segundo ele, existem esforços no sentido de pensar o desenvolvimento do país em uma perspectiva regional, "mas é possível e desejável ir além, ao procurar enxergar diversas espacialidades, que existem por exemplo dentro de uma mesma cidade".
Em sua opinião, trata-se de "pensar as desigualdades com as pessoas inseridas no espaço". Isso é possível, por exemplo, com o aprimoramento de políticas habitacionais nos municípios brasileiros que experimentam dinamismo demográfico e econômico, mediante parcerias interinstitucionais e participação de segmentos da população, com vistas ao incremento da autoestima local e da cidadania.
Outra proposta que surge da pesquisa sobre os programas de combate ao déficit habitacional brasileiro, sugere que se evite a formação e a expansão de periferias urbanas, mediante a adoção de planos diretores participativos, que incentivem a redução da ociosidade imobiliária. "Boa parte do projeto Minha casa, minha vida pode estar sendo implantada sem esse cuidado", acredita. Ralfo Matos afirma que as cidades poderiam ser menos alongadas em termos de periferia física, desde que se optasse por otimizar custos urbanos e revalorizar a estrutura já existente.
Parte das conclusões da pesquisa podem ser encontradas no artigo Desigualdades socioespaciais, inserções teóricas e conceituais e discussão do caso brasileiro, de autoria de Ralfo Matos e que integra o livro Desigualdades, redes e espacialidades emergentes no Brasil, cujo lançamento acontece nesta sexta-feira, 13, em Belo Horizonte.
No artigo, Ralfo Matos faz um breve exame da questão histórica das desigualdades sociais no Brasil, desde o século 19, mostrando a manutenção desse quadro no século 20. O autor fornece dados comparativos do Brasil com outros países e identifica que "apesar de alguma redução mais recentemente, ainda somos um dos campeões das desigualdades sociais e econômicas".
O pesquisador chama a atenção para o significado da desigualdade socioespacial e apresenta classificação em que se refere às desigualdades de tipo internacional – que opõe países centrais e países periféricos, ou envolve os chamados blocos regionais – e as de tipo infranacional. "Nesta segunda categoria inserem-se as desigualdades interregionais e as intrarregionais. Dentro das regiões há desigualdades que contrapõem cidade e campo; ou cidades versus cidades", explica.
Segundo ele, dentro de uma cidade há certos tipos de desigualdade frutos da existência de áreas degradadas e abandonadas. "As pessoas que residem nessas áreas, além de serem vítimas de discriminação econômica, racial e de gênero, ainda o são do ponto de vista socioespacial, porque têm vergonha do lugar onde moram".
O autor do artigo ainda discute a diferença conceitual entre desigualdade, segregação, exclusão, examina o Brasil dos últimos 20 anos e aponta tendências que se descortinam nesse período.