terça-feira, 16 de novembro de 2010

Pesquisa observa relação do homem com a paisagem



Estudo desenvolvido em Ipeúna (SP) atenta para as mudanças ocorridas no cenário rural, a necessidade de otimizar a aplicação de recursos e implantar programas duradouros de educação ambiental
Crédito: Mario Masaru Sakaguti Junior 


 DA ESALQ

A partir da segunda metade do século 20, o Brasil passou por um acelerado processo de urbanização. O êxodo rural e conseqüente inchaço das cidades influenciaram no desenrolar de uma nova ordem política, econômica, social e cultural. Como conseqüência, as questões ambientais passaram a fazer parte da agenda de discussões referentes ao modelo de desenvolvimento colocado em prática em determinada região. Para o gestor ambiental Mario Masaru Sakaguti Junior, "a realização de pesquisas na área ambiental tornou-se fundamental para prevenir, remediar e mitigar danos ao ambiente".

Com objetivo de investigar o processo de transformação do espaço a partir das ações humanas, Sakaguti desenvolveu, no programa de pós-graduação em Ecologia Aplicada (Interunidades ESALQ/CENA), a pesquisa "Significados das paisagens da microbacia do ribeirão dos Sinos, Ipeuna, SP". Orientado pelo professor Antônio Ribeiro de Almeida Junior, do Departamento de Economia, Administração e Sociologia (LES), o pesquisador observou as relações entre a conformação da paisagem e as visões de mundo, as representações sociais e simbólicas dos proprietários rurais. Segundo Sakaguti, a escolha do local deveu-se à importância estratégica da bacia do rio Corumbataí, onde está inserida a microbacia do ribeirão dos Sinos, para a conservação de recursos hídricos. "O Corumbataí é estratégico por ser o principal manancial para o abastecimento de seis cidades da região, além de Piracicaba, Charqueada, Rio Claro, Corumbataí, Itirapina e Santa Gertrudes. Além disso, a microcabia do ribeirão dos Sinos tem pequenas dimensões, o que permitiu uma investigação em profundidade devido sua proximidade com a zona urbana", comenta.

As alterações do cenário rural e a visão de seus habitantes foram abordadas de forma exploratória e qualitativa, a partir de entrevistas realizadas com proprietários rurais e membros da população de Ipeuna entre maio de 2008 e maio de 2009. "Além dos proprietários, conversamos com caseiros, agente imobiliário, delegado, agrônomo, pesquisador da história local, representantes de instiuições e indústrias e proprietários de outras microbacias. Esse contato permitiu que as conversas fossem conduzidas sem que se perdesse o foco nos temas principais", relata autor do projeto.

Ipeúna foi um pequeno distrito de Rio Claro até 1964, quando foi emancipada e, segundo o pesquisador, seu processo de modernização, em comparação com outras cidades, foi recente. Apesar da aparência de conservação da microbacia do ribeirão dos Sinos, a pesquisa identificou diversos problemas ambientais citados pelos entrevistados, com destaque para as queimadas, a erosão, o assoreamento, a escassez de água e danos causados por javalis. Com relação à economia local, o município ainda está passando por um período de transição de uma economia baseada na agricultura para uma economia baseada nas indústrias e nos complexos agroindustriais. "O contexto social é marcado pela adaptação dos antigos moradores à chegada de novos habitantes, estranhos ao seu círculo de convivência e às transformações sociais, econômicas e culturais. Constatamos que os pequenos produtores rurais tradicionais enfrentam dificuldades crescentes para sobreviver da atividade agropecuária e seu modo tradicional de produção está prestes a ser abandonado em definitivo", alerta Sakaguti.

Além disso, de acordo com o estudo, há diferenças marcantes de atribuições de significados às paisagens entre as famílias ipeunenses tradicionais e os novos moradores. A beleza das paisagens é valorizada enfaticamente pelos proprietários de chácaras, que estão em condições de aproveitar o tempo com atividades de lazer. Por outro lado, devido ao longo período de convivência no lugar, os sentimentos e as memórias depositadas sobre as paisagens e propriedades rurais pelas famílias ipeunenses tradicionais são mais profundos e íntimos, refletindo suas próprias histórias de vida. "A realização da pesquisa gerou conhecimentos e informações que podem ser úteis para a gestão de bacias hidrográficas, para a elaboração de políticas públicas e implantação de programas duradouros de educação ambiental. Conhecendo um pouco mais sobre as motivações, a cultura e os anseios das pessoas, é possível definir projetos e políticas que teriam maiores probabilidades de obterem sucesso, otimizando a aplicação de recursos públicos e contando preferivelmente com o apoio e a participação das populações locais", conclui o pesquisador.

Texto: Caio Albuquerque