quinta-feira, 10 de março de 2011

PARA COMER MELHOR E CONTAMINAR MENOS

Ecoagricultura para comer mais e contaminar menos

Por Stephen Leahy, da IPS





Uxbridge, Canadá, 10/3/2011 – Em dez anos, a agricultura ecológica poderá duplicar a produção de alimentos em regiões inteiras, além de mitigar a mudança climática, segundo um informe da Organização das Nações Unidas, divulgado em Genebra. Uma virada urgente para a “ecoagricultura” é a única maneira de acabar com a fome e de enfrentar os desafios da mudança climática e da pobreza rural, disse Olivier de Schutter, relator especial das Nações Unidas sobre Direito à Alimentação, após a apresentação de seu informe anual, no dia 8, no Conselho de Direitos Humanos.


“A agroecologia imita a natureza, não os processos industriais. Substitui os insumos externos, como fertilizantes, com o conhecimento de como uma combinação de plantas, árvores e animais podem potencializar a produtividade da terra”, disse Olivier à IPS. “O rendimento aumentou 214% em 44 projetos em 20 países da África subsaariana com o uso de técnicas de agricultura ecológica durante o período de três a dez anos, muito mais do que nenhum cultivo geneticamente modificado jamais conseguiu”, acrescentou.

Outros estudos científicos mostram que pequenos agricultores em 57 países que usam técnicas agroecológicas obtiveram aumento médio de 80% em sua produção. O aumento dos africanos foi de 116%. “A evidência científica atual demonstra que o desempenho dos métodos agroecológicos supera o do uso de fertilizantes químicos no estímulo à produção alimentar em regiões onde vivem os famintos”, disse Olivier.

A agroecologia aplica a ciência ecológica ao desenho de sistemas agrícolas. Potencializa a produtividade do solo e protege os cultivos contra as pestes dependendo de elementos naturais. A ecoagricultura não requer pesticidas caros e fertilizantes à base de combustíveis fósseis, bem como máquinas caras ou sementes híbridas. É ideal para pequenos agricultores pobres e criadores de gado, que são a maior parte do um bilhão de famintos do mundo.

Os esforços dos governos e dos principais doadores, como a Aliança para uma Revolução Verde na África (Agra), de US$ 400 milhões, para subsidiar fertilizantes e sementes híbridas, darão um rápido impulso aos rendimentos, mas não serão sustentáveis no longo prazo, disse Olivier. A Fundação Gates e a Fundação Rockfeller, que contribuem com fundos, consideram que o caso do Malawi é de sucesso entre os projetos da Agra. Entretanto, o país não pode se dar ao luxo de continuar com os subsídios aos fertilizantes, e está optando pela agroecologia.

“O governo do Malawi agora subsidia os agricultores para que plantem árvores que fixem o nitrogênio, para garantir um crescimento sustentado na produção de milho”, acrescentou Olivier. Para ele, é de se esperar que os países se mostrem céticos para as soluções agroecológicas “porque não estão em linha com o modelo dominante”. Este modelo agrícola dominante é o enfoque industrial, que busca maximizar a eficiência e os rendimentos. Porém, este sistema depende totalmente de combustíveis fósseis baratos e nunca presta contas pela degradação ambiental e por outros impactos que possa causar. Um desses impactos é na mudança climática.

“É justo dizer que entre 45% e 50% de todas as emissões de gases-estufa são gerados na atual forma de produção de alimentos”, disse Olivier. As emissões prejudiciais para o clima originadas na agricultura industrial são mais que o dióxido de carbono desprendido na queima de combustíveis fósseis. Incluem enormes quantidades de gases causadores do efeito estufa, como o metano emitido pelos animais e o óxido nitroso dos fertilizantes químicos.

Soma-se a isto o desmatamento, praticado principalmente para aumentar as áreas destinadas à agricultura, e as emissões derivadas do processamento de alimentos e transporte de longa distância dos alimentos em todo o mundo, chega-se a quase metade de todas as emissões humanas. A ecoagricultura pode produzir mais alimentos para os mais pobres do mundo, e ao mesmo tempo emitir apenas uma fração das contaminações, além de armazenar carbono no solo, afirmou Olivier.

O movimento internacional Via Camponesa procuram aplicar esse modelo pelo menos desde 2009. Seus membros “podem ajudar a esfriar o planeta”, disse à IPS o agricultor haitiano Chavannes Jean-Baptiste. “A evidência é irrefutável. Se podemos mudar a maneira como cultivamos, produzimos e distribuímos os alimentos, temos uma solução poderosa para combater a crise climática”, disse Henk Hobbelink, coordenador da organização não-governamental Grain.

Em 2009, esta entidade publicou um informe mostrando que a agricultura industrial era, de longe, a maior fonte de emissões de gases-estufa. “Para conseguir estes resultados não há obstáculos técnicos. É somente uma questão de vontade política”, disse Henk à IPS. Envolverde/IPS
(IPS/Envolverde)