quinta-feira, 2 de junho de 2011

PATRIMÔNIO AMBIENTAL DA AMAZÔNIA

“Geoestatísticas” revelam patrimônio ambiental da Amazônia Legal – Fonte IBGE



Quando se trata da Amazônia Legal, o tema cobertura vegetal aparece, via de regra, como a principal preocupação. Mas o patrimônio ambiental dessa extensa parcela do território brasileiro vai além da floresta e outros tipos de vegetação. Inclui, por exemplo, um subsolo formado por rochas com alto potencial de armazenamento e transferência de água potável e um solo com um estoque considerável de carbono, que, se liberado para a atmosfera, pode alterar o balanço dos gases de efeito estufa.

Essas e outras riquezas são reveladas pelas “Geoestatísticas de Recursos Naturais da Amazônia Legal”, uma publicação que reúne informações sobre os recursos naturais da região - vegetação e cobertura da terra; relevo; solos; e rochas e recursos minerais -, muitas das quais podem se tornar indicadores úteis ao acompanhamento sistemático da utilização e do estado de conservação desses recursos.

As estatísticas selecionadas são geradas a partir do Banco de Dados e Informações Ambientais (BDIA), mantido pelo IBGE, que reúne desde as informações levantadas pelo Projeto RADAMBRASIL, nas décadas de 1970 e 1980, até dados mais recentes, datados de 2002. Os dados de vegetação e relevo de toda Amazônia Legal, assim como parte dos dados relativos a solos e geologia, já estão acessíveis na página do IBGE (ftp://geoftp.ibge.gov.br/mapas/banco_dados_georeferenciado_recursos_naturais/).

Para o restante do território brasileiro, a meta é disponibilizar os dados até 2014. Embora as informações do BDIA não se prestem ao monitoramento em tempo real das mudanças da cobertura da terra na Amazônia Legal, auxiliam na compreensão de como esses processos ocorrem e das tendências de médio e longo prazo.

A Amazônia Legal ocupa 5.016.136,3 km2, que correspondem a cerca de 59% do território brasileiro. Nela vivem em torno de 24 milhões de pessoas, segundo o Censo 2010, distribuídas em 775 municípios, nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins (98% da área do estado), Maranhão (79%) e Goiás (0,8%). Além de conter 20% do bioma cerrado, a região abriga todo o bioma Amazônia, o mais extenso dos biomas brasileiros, que corresponde a 1/3 das florestas tropicais úmidas do planeta, detém a mais elevada biodiversidade, o maior banco genético e 1/5 da disponibilidade mundial de água potável.

A seguir os principais destaques das “Geoestatísticas de Recursos Naturais da Amazônia Legal”, cuja íntegra pode ser consultada no endereço:


Amazônia Legal concentra cerca de 45% da água subterrânea potável do país

Os conhecimentos sobre a distribuição e a frequência com que minerais e rochas ocorrem na Amazônia Legal possibilitam avaliar, por exemplo, o potencial de produção de água subterrânea (potencial hídrico); combustíveis fósseis (petróleo, por exemplo); e da formação de concentrações de minérios de valor econômico na região. Foram investigados 14 indicadores sobre esse tema.

As rochas sedimentares, originadas a partir da alteração, erosão, transporte e deposição de qualquer outro tipo de rocha, compõem 66,8% da área da Amazônia Legal. Elas propiciam a formação de aquíferos porosos, espécie de reservatórios subterrâneos, capazes de armazenar grandes volumes de água, em quantidade suficiente para ser utilizada como fonte de abastecimento. Estima-se que 91% da água subterrânea do Brasil estariam em aquíferos porosos, dos quais 49,45% estariam na Amazônia Legal, ou seja, a região responde por cerca de 45% de toda a água subterrânea do país.

A participação dos aquíferos porosos em relação à área emersa total (superfície, excluindo-se os rios) da Amazônia Legal é de 68,3%, e há três principais províncias, ou grandes áreas, de rochas sedimentares: a do rio Amazonas, a do rio Parnaíba ou do Meio-Norte e a do Paraná-Parecis, que, em conjunto com as reservas de menor porte, abrigam um total de 101.920 km3 de água doce.

As maiores áreas de aquíferos porosos encontram-se no Amazonas (1.344.201,7 km2), em Mato Grosso (677.135,1 km2) e no Pará (513.818,9 km2). O Acre e o Maranhão têm os maiores índices de participação, superiores a 90%, reflexo de um subsolo constituído quase que unicamente por rochas sedimentares. Roraima (33,8%) e Amapá (33,2%) apresentam os percentuais mais baixos, embora as extensões de aquíferos porosos em ambos os estados também sejam bastante significativas.

Por ser formado predominantemente por rochas sedimentares, o subsolo da Amazônia Legal também tem potencial para exploração de combustíveis fósseis, o que pode ser confirmado pelos campos de petróleo e gás de Urucu, no Amazonas. Há boas perspectivas de acumulação dessas substâncias nas rochas sedimentares das bacias costeiras do Maranhão, Pará e Amapá, além de reservas de gás natural no município de Capinzal do Norte (MA).

Ainda nas áreas de rochas sedimentares, há também a possibilidade de serem encontradas jazidas de calcário, utilizáveis tanto na agricultura como para o fabrico de cimento; sal-gema e gipsita, fontes de gesso para a medicina e a construção civil; e anidrita, fonte de sulfato e cálcio. Apesar de possuírem menor potencial metálico, minerais desse tipo e pedras preciosas podem ser encontrados na região. Depósitos de ouro, cassiterita e diamante são comuns.

Pará tem mais da metade de rochas que podem formar jazidas de metais nobres

Já as rochas ígneas (15,1% da área da Amazônia Legal), provenientes da consolidação do magma (massa rochosa do interior da terra em estado de fusão), e as metamórficas (16,1%), resultado de alterações sofridas por outros tipos de rochas em decorrência de mudanças nas condições físicas ou químicas (mudanças na temperatura e pressão, por exemplo), apresentam maior potencial mineral.

As rochas ígneas têm tendência à formação de jazidas de metais nobres, como o ouro, e de minerais industriais, como a cassiterita, e estão mais concentradas na Amazônia Central, uma faixa quase contínua que se estende do sudeste do Pará ao norte de Roraima e ao noroeste do Amazonas (ver mapa na página anterior). O Pará abriga 51,9% das rochas ígneas da Amazônia Legal, em seguida, vem Mato Grosso, com 14,2%. O Acre possui a menor extensão relativa deste tipo de rocha, menos de 0,01% do território do estado.

Além de metais preciosos as rochas ígneas também apresentam potencial hídrico subterrâneo, com a ocorrência dos chamados aquíferos fraturados, que acumulam água em rachaduras nas rochas e representam uma reserva de 10.080km3 de água doce no Brasil, dos quais estima-se que pelo menos 6.048 km3 (60%) estejam na Amazônia Legal.

As rochas metamórficas apresentam potencial como fonte de ouro primário. São propícias também à formação de jazidas minerais de uso industrial, notadamente de ferro e manganês, e de sulfetos de cobre, chumbo e zinco. São, ainda, fontes de material para construção civil, como brita e rochas ornamentais. O Pará detém 37,3% da extensão desse tipo de rocha na Amazônia Legal, enquanto Acre (um percentual muito próximo de zero) e Maranhão (0,8%) apresentam proporções pouco significativas.

Carbono armazenado no solo é maior que na atmosfera

A informação dos cinco indicadores reunidos no tema solo é valiosa para a compreensão de temas relevantes para a Amazônia Legal, como o desenvolvimento agrícola e a preservação de áreas de risco.

No ecossistema terrestre, o solo é um compartimento chave no processo de redução da emissão de gases do efeito estufa, pois possui grande estoque de carbono. O solo retém, no primeiro metro de profundidade, cerca de duas vezes o estoque encontrado na atmosfera.

Estima-se que, no Brasil, 75% das emissões de CO2 sejam oriundas de mudanças no uso da terra, seja pela erosão e a decomposição da matéria orgânica dos solos, seja pela conversão de florestas e outras formas de vegetação natural para o uso agropecuário. Daí a importância dos estoques de carbono para o balanço de gases de efeito estufa na atmosfera.

Em média, o solo da Amazônia Legal tem, no seu horizonte superficial (profundidade máxima de 50 cm, com espessura média de 30 cm) um estoque de carbono orgânico de 55,7 toneladas por hectare, sendo que essa concentração não é uniforme e varia entre 0,1 e 208,7 toneladas por hectare, com predomínio da classe de 40 a 60 t/ha.

Ao considerar a profundidade de até um metro de solo, o valor médio do estoque de carbono aumenta para 95,7 t/ha, podendo chegar ao máximo de 250,5 t/ha, com predomínio da classe de 80 a 100 t/ha. O mapa a seguir localiza, na Amazônia Legal, as faixas de concentração de carbono em até um metro de profundidade do solo.

Vegetação é fundamental para equilíbrio de processos erosivos na Amazônia Legal

O conhecimento do relevo é de grande importância para a organização, o planejamento e a gestão territoriais, já que ele exerce influência sobre a distribuição da população e condiciona, em certa medida, as atividades econômicas e a estruturação da rede viária. Foram analisados cinco indicadores sobre o tema.

Na Amazônia Legal, predomina um relevo colinoso, ou suavemente ondulado, em grande parte com densa cobertura vegetal, cuja manutenção é fundamental para o equilíbrio da atuação dos processos erosivos. A manutenção da vegetação também tem papel importante nas áreas sujeitas a inundações, que correspondem a 12,4% do território da Amazônia Legal, como as planícies fluviais, marinhas e lacustres (que margeiam lagos).

As áreas de relevo mais acidentado, com classes de intensidade de dissecação “forte” (12,4% da área) e “muito forte” (11,0% da área), estão mais concentradas no extremo oeste da Amazônia Legal, nos estados do Acre e do Amazonas, no oeste do Amapá, noroeste do Pará e de Roraima e norte de Mato Grosso. São áreas de extrema fragilidade ambiental, sobretudo considerando que sobre elas registram-se avanços da ação do homem ao longo de eixos rodoviários, derrubando a floresta e contribuindo para a aceleração dos processos erosivos, com prejuízo para as vias de acesso e para o escoamento da produção.

O total da área antropizada (com vegetação original substituída por outro tipo de cobertura devido à ação do homem) na Amazônia Legal correspondia a 752.202 km² ou 15% da superfície total em 2002. Em números absolutos, os estados que possuem maiores áreas alteradas pelo homem são Maranhão, com 139.239 km2, representando 53% de sua área; Mato Grosso, com 233.416 km2 ou 25,8% do total; e Pará, com 203.606 km2 ou 16,3% do total. Nos estados do Amazonas, Amapá, Roraima e na porção mais ocidental do Pará e do Acre, as ocupações são mais rarefeitas e ocorrem por meio de vias de circulação como os rios ou estradas abertas em áreas de vegetação natural.
Saldo histórico do desmatamento: 2,6 bilhões de árvores eliminadas até 2002

Dividido em 16 indicadores, o tema vegetação e cobertura da terra mostra, entre outros, os efeitos históricos da ação do homem na floresta e em outros tipos de vegetação da Amazônia Legal. Cerca de quatro milhões de quilômetros quadrados da Amazônia brasileira eram originalmente recobertos por florestas e, até 2002, a área desmatada já era da ordem de 15,3% do total da vegetação – percentual que já aumentou desde então. O processo de desmatamento acentuou-se nas últimas quatro décadas, concentrado nas bordas sul e leste da Amazônia Legal (arco do desmatamento).

Até 2002, a região havia sofrido a eliminação de 2,6 bilhões de árvores, o que correspondia a aproximadamente 13% do total de árvores com diâmetro maior que 33 cm nas florestas. Em termos de volume, 4,7 bilhões de metros cúbicos de madeira foram eliminados pelo desmatamento nas formações florestais na Amazônia Legal até 2002.

O desmatamento foi responsável pela eliminação de aproximadamente 23 bilhões de toneladas (12,7%) de biomassa, ou matéria orgânica de origem vegetal, e 6,6 bilhões de toneladas de carbono (12,7%) das formações florestais da Amazônia Legal até 2002. Estima-se que, naquele ano, havia aproximadamente 157 bilhões de toneladas de biomassa e 45 bilhões de toneladas de carbono remanescentes nas formações florestais da Amazônia Legal.

Em 2002, uso da terra afetava 15,3% da vegetação da Amazônia Legal

Em 2002, o antropismo, ou a mudança na cobertura da terra por interferência humana, por meio de atividades de desmatamento e queimadas, atingia 15,3% da área de vegetação primária da Amazônia Legal.

A pecuária se destaca como o principal uso que altera a cobertura da terra, representando 51,7% da vegetação antropizada na Amazônia Legal, enquanto a vegetação secundária (vegetação que surge naturalmente após o abandono de áreas antes usadas pelo homem) corresponde a 32,1%, e a agricultura, a 15,2%.

Os estados do Maranhão, de Goiás, do Tocantins, de Mato Grosso e de Rondônia tinham mais de 20% da vegetação antropizada. Da parcela de território maranhense inclusa na Amazônia Legal, 54% da vegetação primária apresentava antropismo em 2002. Já o Amazonas tinha o menor grau de antropismo: apenas 1,5% da vegetação alterada.



Ricardo Bergamini