Desastres climáticos registrados nos primeiros nove meses deste ano foram responsáveis por 21 mil mortes - o dobro do número confirmado no mesmo período do ano passado, segundo dados divulgados pela organização humanitária Oxfam.
O relatório cita as enchentes no Paquistão, as ondas de calor na Rússia e a elevação do nível do mar em Tuvalu, como exemplos das letais conseqüências das mudanças climáticas. E o futuro não é nada promissor: um outro estudo revela que em 50 anos, o mundo estará 4 graus Celsius mais quente, o que vai impor severas alterações climáticas.
Os dados foram divulgados na segunda-feira (29/11), dia de abertura da 16ª Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-16), em Cancún, no México. A cerimônia de abertura foi marcada por discursos para forçar um novo engajamento dos países em torno de um acordo para conter o aquecimento global.
A secretária-executiva da convenção, Christiana Figueres, chegou a apelar para os deuses, pedindo que a deusa maia da Lua, Ixchel, inspire os negociadores dos 194 países que participam do evento.
- Bem-vindos à terra da deusa maia da Lua, Ixchel, que também era deusa da razão, da criatividade e da liderança - afirmou ela. - Que ela inspire a todos vocês, porque hoje (segunda-feira) vocês estão reunidos aqui em Cancún para chegar a uma sólida resposta às mudanças climáticas, usando razão e criatividade. Estou convencida de que daqui a 20 anos vamos admirar a tapeçaria que nos tecemos juntos e lembrar com carinho de Cancún e da inspiração da deusa Ixchel.
Segundo o documento da Oxfam, as enchentes no Paquistão inundaram um quinto do país, matando 2 mil pessoas e afetando 20 milhões em razão da destruição de casas, escolas, rodovias e cultivos e da disseminação de doenças. Um prejuízo estimado em US$ 9,7 bilhões.
Na Rússia, as temperaturas excederam a média de julho e agosto em 7,8 graus Celsius, o que fez a taxa diária de óbitos em Moscou dobrar, alcançando 700. Pelo menos 26 mil focos de incêndio destruíram um quarto das plantações de trigo, gerando um problema nas exportações.
Os moradores da nação insular Tuvalu, no Pacífico, onde a elevação do nível do mar é de 5 a 6 milímetros ao ano, enfrentam cada vez mais dificuldades para manter cultivos, uma vez que a água salobra está invadindo as plantações.
E o futuro será muito pior, como apontam dados climáticos. As crianças de hoje vão alcançar a velhice num mundo 4 graus Celsius mais quente, onde certezas climáticas que valeram para os últimos dez mil anos não serão mais referência. Secas, enchentes e migrações em massa serão parte da vida diária já a partir de 2060.
Será provavelmente a década a partir da qual, pela primeira vez desde o fim da Idade do Gelo, a Humanidade terá que lidar com um clima global bastante instável e imprevisível. As previsões fazem parte de uma série de estudos científicos publicados na segunda-feira (29/11) sobre o mundo 4 graus Celsius mais quente.
As negociações em Cancún ainda giram em torno de tentar manter a elevação das temperaturas em, no máximo, 2 graus Celsius. Segundo muitos cientistas, no entanto, as atuais tendências revelam que um aumento de 3 a 4 graus é "muito mais provável".
A maior preocupação é que uma elevação de 4 graus Celsius na temperatura média global - uma diferença tão grande quanto a que separa o clima atual daquele registrado na última Idade do Gelo - geraria transformações dramáticas no mundo, levando a secas, colapso da agricultura em regiões semiáridas e a um catastrófico aumento do nível do mar em áreas costeiras.
O anfitrião da COP-16, o presidente mexicano Felipe Calderon, fez um apelo para que os negociadores cheguem a um acordo para mudar os rumos da crise climática.
Ele disse que as futuras gerações irão cobrar, caso eles falhem em alcançar um resultado.
- Será uma tragédia que nossa incapacidade nos leve a falhar - afirmou, citando que em seu país só este ano 60 pessoas morreram por desastres causados pelo aquecimento da Terra. Catarina Alencastro/O Globo, 30/11 |