Segundo o documento, na safra 2009/10, o Mato Grosso deve ser responsável por 18,7 milhões de toneladas de soja, o equivalente a 28% da produção nacional. O Estado é, disparado, o maior produtor do país. No entanto, o cultivo do produto tem sido um dos principais vetores do desmatamento do Cerrado e também tem se expandido sobre áreas de devastação recente na Amazônia.
A pesquisa conclui que, apesar dos esforços de espaços como as Mesas Redondas da Soja e do Biocombustível Sustentáveis, e da Moratória da Soja, o setor empresarial tem se afastado das discussões. O relatório indica que, mesmo com o acordo, prevendo o fim da comercialização da soja produzida em áreas desmatadas, o plantio do grão voltou a se expandir sobre áreas desflorestadas em 2009.
Para chegar a essas conclusões, a Repórter Brasil cruzou dados de autuações de crimes ambientais entre 2007 e 2009, por desmatamento e impedimento de regeneração de vegetação nativa- fornecidos pelo Ibama- com os registros da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), instrumento de padronização nacional dos códigos de atividade econômica.
A análise resultou em ao menos 34 casos de fazendas com soja autuadas no Mato Grosso. Elas estariam localizadas em municípios mato-grossenses totalmente incluídos na Amazônia, como Cláudia, Itanhangá, Itaúba, Lucas do Rio Verde, Nova Ubiratã, Porto dos Gaúchos, Querência , Ribeirão Cascalheira, Santa Carmem, Sinop e Vera. Os problemas não existem apenas no Mato Grosso.
No Pará, o cruzamento das autuações por crimes ambientais do Ibama com a CNAE também sugeriu relações da soja com problemas ambientais em 11 autuações ocorridas entre 2007 e 2009: três casos em Belterra, outros três em Dom Eliseu, dois em Santarém, um em Paragominas e mais três em Ulianópolis.
A ONG Greenpeace, uma das entidades propositoras da Moratória da Soja, informou aos realizadores do estudo que o crescimento da produção do grão em locais devastados em 2009 se deve, em parte, ao ciclo produtivo das áreas de desmatamento na Amazônia.
"Inadequadas ao cultivo imediato da soja, os solos desmatados são destinados primeiramente ao plantio de arroz e milho, culturas que "amansam" a terra, para depois receberem a oleaginosa. Assim, novos desmatamentos ocorridos a partir de 2006 passaram a ser usados para o plantio de soja apenas ano passado, o que tem aumentado o número de propriedades em desacordo com a Moratória", explicou a ONG, segundo o relatório.
Devastação em assentamentos
Além de avaliar a relação de usinas de biodiesel com a cadeia produtiva da soja, apontando o desrespeito a critérios de sustentabilidade por essa produção, a pesquisa identifica irregularidades no cumprimento das normas do Selo Combustível Social.
De acordo com o documento, no Mato Grosso, enquanto as usinas incentivam o cultivo de soja por beneficiários da reforma agrária, para atingir os 15% de gastos com a agricultura familiar previstos pelo Selo, o Incra vem tendo dificuldades para implementar projetos de desenvolvimento sustentável e regularização ambiental nos assentamentos.
Isso tem levado a uma situação de insegurança social e jurídica, além de problemas de subsistência dos assentados, irregularidades fundiárias e crimes ambientais.
Em função de desmatamentos de grandes áreas de floresta amazônica no Estado, assentamentos como Mercedes I/II (em Tabaporã), Mercedes 5 (em Ipiranga do Norte), Itanhangá (em Tapurah), Pingo D'Água (em Querência), Nova Cotriguaçu (em Cotriguaçu) e Macife I (em Bom Jesus do Araguaia), por exemplo, foram parcial ou totalmente embargados pelo Ibama nos últimos três anos.
Os problemas ambientais, no entanto, não têm interferido nos acordos de compra da soja para a produção de biodiesel.
Trabalho Escravo
O estudo também identificou o emprego de trabalho escravo na produção de soja. Autuações para libertação de trabalhadores escravos em propriedades com lavoura do grão, entre 2007 e 2009, atingiram ao menos 13 fazendas nos Estados da Bahia, Goiás, Maranhão, Piauí, Tocantins, Mato Grosso e Pará, de acordo com levantamento realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Na Amazônia, dados dos grupos móveis de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho apontam que ao menos quatro propriedades com cultivo de soja tiveram libertações de trabalhadores escravos entre 2007 e 2009 - fazenda Colorado, em Nova Canaã do Norte (MT), fazenda Vale do Rio Verde, em Tapurah (MT), fazenda Curitiba, em Ribeirão Cascalheira (MT), e uma propriedade na Gleba Pacoval, em Santarém (PA).
Por: Fabíola Munhoz